O lema “Más que un equipo, todo un pueblo” (Mais do que um time, todo um povo) está em vários lugares do estádio Municipal de La Cisterna, no Chile. Escrita em espanhol e em mouro, a frase é uma referência aos palestinos e também uma motivação para os jogadores do Club Deportivo Palestino. O time chileno, que move uma torcida apaixonada, é o próximo opoente do Cruzeiro pela Despensa Sul-Americana.
Fundado em 1920 por migrantes que decidiram erigir sua vida no Chile, o time de futebol é espargido por suas frequentes demonstrações de esteio à geração de um Estado palestino no Oriente Médio e pela resguardo dos que vivem nos territórios da Cisjordânia e de Gaza. Aliás, tornou-se um gavinha entre a região e o Chile, que tem o maior comunidade palestina fora do mundo mouro.
Segundo Ricardo Marzuca, integrante do Meio de Estudos Árabes da Universidad de Chile, os primeiros palestinos chegaram ao país no final do século 19, em meio à decadência do Poderio Turco-Turco e à crise econômica gerada. Ele explica que essa transmigração se deu no contexto do movimento de sírios e libaneses rumo às Américas.
Até o término da Segunda Guerra Mundial, o Chile recebeu entre 8 milénio e 10 milénio árabes, sendo a maioria palestinos cristãos ortodoxos, que viram no país um clima semelhante ao da terreno natal. Esse êxodo continuou nos anos seguintes, principalmente devido à geração do Estado de Israel, em 1948.
“A história do Palestino acaba com o argumento de que a Palestina nunca existiu. Uma vez que poderia ter um time de futebol no Chile fundado por migrantes palestinos mais de 20 anos antes do surgimento de Israel?”, questiona Nicolás Abusada, 45, um dos diretores do clube. “Hoje, a sonância que o time tem para o mundo é enorme e colabora com a justificação palestina.”
O Palestino já conquistou dois títulos na primeira repartição do Campeonato Chileno, dois na segunda e três na Despensa Chile. Em torneios continentais, participou sete vezes da Despensa Libertadores da América e outras sete da Sul-Americana. Nesta última, a sua melhor campanha foi em 2016, quando foi eliminado nas quartas de final pelo prateado San Lorenzo.
Na Sul-Americana de 2025, o time divide o Grupo E com o Cruzeiro, o Mushuc Runa, do Equador, e o Unión Santa Fe, da Argentina. Até o momento, depois duas rodadas, ocupa a segunda posição, com uma vitória e uma guia. A partida contra o time mineiro ocorrerá nesta quinta-feira (24), e os “árabes”, porquê são conhecidos, serão os mandantes. O confronto acontecerá em Coquimbo, no setentrião do Chile, por falta de estrutura adequada no estádio do clube chileno.
Memória e tradição
Inaugurado em 1988, o estádio do Palestino está localizado em La Cisterna, região distante do núcleo de Santiago, e tem capacidade para 12 milénio pessoas. Em dia de jogo, torcedores com o seu kuffiye –lenço típico palestino– entoam cânticos e balançam bandeiras da Palestina. Na hora da inópia, falafel e shawarma são algumas opções.
Sempre que pode, Carlos Medina, 49, vai ao estádio seguir o seu time do coração. “Eu sabor do envolvente familiar e tranquilo de lá”, diz. Bisneto de um palestino nascido em Beit Jala, o engenheiro de informática acompanha o futebol desde gaiato, apesar de não ter sido incentivado pelos pais a gostar do esporte. Somente quando já era mais velho passou a frequentar o estádio de La Cisterna para ver a equipe tricolor jogar.
Hoje, Medina é o responsável pelo site Palestino Histórico, que compila informações e histórias do clube. “A página nasceu a partir do documentário ‘Cuatro Colores’, que é sobre o time. Quando terminou todo o processo, descobri que muitas informações ficariam fora. Foi aí que resolvi reuni-las em um site e contá-las de maneira correta, pois até portanto ninguém tinha feito isso”, lembra.
Uma das seções do site é dedicada aos jogadores que tiveram maior destaque no time. Entre eles está Roberto Coli, integrante da equipe que conquistou o primeiro título vernáculo do Palestino, em 1955. Ídolo de Medina, Oscar Fabbiani é considerado um dos maiores jogadores do clube e, entre 1975 e 1978, ganhou um Campeonato Chileno e duas Copas Chile.
Outro jogador que fez história no Palestino foi Elías Figueroa. Logo depois de ter se tornado ídolo em solo brasílico jogando pelo Internacional nos anos 70, o chileno foi contratado pelos “árabes”, que defendeu de 1977 e 1980. Na dez de 90, Figueroa foi técnico do tricolor e deixou o clube em 1996, quando retornou a Porto Satisfeito para treinar o Inter.
O Palestino tem sido presença frequente nos torneios continentais. A participação recorrente e as causas defendidas têm levado o clube a aumentar sua torcida de maneira significativa. Hoje, possui torcedores também no Oriente Médio, onde os jogos são transmitidos pela Al Jazeera. Uma paixão que ultrapassou fronteiras e estreita uma relação antiga.